terça-feira, 3 de abril de 2012

A máquina de sonhos


Quando "..." me deixou, dormir passou de uma necessidade básica para luxo. E quando eu conseguia, ele, "...", invadia meus sonhos.

As vezes era só a imagem dele tocando violão. Em outras, dizia se arrepender de ter ido embora e que queria ficar um pouco mais. Houve sonhos em que "..." era firme na decisão tomada e em outros -raríssimos- era como se nunca tivesse me deixado e esse buraco em mim nunca existisse.

Os sonhos eram tão reais que dava para sentir o cheiro dele e toda a emoção -indecifráveis- que eu sentia quando o tocava. Mas aos poucos esses doces sonhos foram se tornando menos frequentes. Passaram de duas vezes na semana, depois uma … até que pararam de existir.

Se alguma força do além me garantisse sonhar com ele todas as noites, acho que eu conseguiria ter mais qualidade de vida naquela época. E talvez eu bebesse menos também.

A verdade é que sonhar com "..." me confortava e me dava um pouco de paz, prazer ou qualquer sentimento bom que tivesse disponível no momento.

Meu sonho de consumo era um programados de sonhos. Um aparelhinho onde eu escolheria com o que ou com quem queria sonhar. Assim teria ele todas as noites. Não dá forma convencional, eu sei. Mas antes uma forma diferente do que forma nenhuma.

Pensando bem, nada mais justo essa maquininha. A gente já se quebra tanto durante o dia, o certo seria sonhar com o que irá (ou iria, o já fez ou qualquer tempo verbal que não tenha nada a ver com presente ou futuro) nos fazer feliz, mesmo que seja por alguns instantes.

As vezes eu acho que posso escrever mil textos, mas nunca nenhum deles irá traduzir a dor de ver alguém que a gente gosta ser levado embora. Eu não sei como é ser a pessoa escolhida, mas conheço bem o que é ser aquela deixada de lado.